Por que o fim do home office tem intensificado o número de demissões voluntárias, por Marilene Martins

Publicado por Comunicação em 06 de maio de 2022

“Com o fim das restrições e o retorno do trabalho presencial os escritórios ficaram pequenos”

Por Marilene de A. Martins Queiroz

O modelo de trabalho em home office ganhou destaque na pandemia agradou a grande maioria das pessoas, porém a modalidade de serviço traz mudanças significativas nas relações de trabalho. Com o fim das restrições e o retorno do trabalho presencial os escritórios ficaram pequenos. Por outro lado, as grandes transformações não serão no ambiente físico ou na estrutura dos escritórios, mas sim nos processos de liderança em torno disso.

Embora a modalidade em home office seja restrita a algumas atividades, esse formato de trabalho pode trazer benefícios e prejuízos simultaneamente tanto para as empresas, assim como para os colaboradores. O sucesso em manter ou não a modalidade em home office vai depender do estilo de liderança e da confiança mútua entre empresa e colaborador.

Como nem tudo são flores, vale lembrar que no auge da pandemia o  home office teve seus dias de glória. Os empresários viram a produtividade dos colaboradores crescerem, o tema foi estampado em artigos e revistas de negócios. O fenômeno também foi reforçado pelas inseguranças dos trabalhadores em relação a empregabilidade. Em casa as pessoas sentiram a necessidade de mostrar que estavam produzindo, mesmo diante das dificuldades de conciliarem o trabalho de uma forma coerente com a rotina da casa e a jornada estabelecida pela empresa.

Assim, a maioria das pessoas se viram trabalhando dentro de casa sem nenhum preparo prévio para isso. Somados as inseguranças em torno da pandemia, todos os papeis foram misturados no contexto familiar, o limiar entre vida pessoal e vida profissional ficou muito estreito e muitos não conseguiram administrar essa dinâmica de forma saudável.

O retrato dessa realidade se resume em “todos juntos e misturados” em casa. As queixas de exaustão de tela e “fadiga do zoom” desencadeou índices elevados de transtornos de ansiedade e outros relacionados ao reflexo da exposição da autoimagem.

Não bastasse isso, os níveis de estresse associado ao excesso de trabalho ampliaram os casos de síndrome de burnout. Assim algumas empresas se viram obrigadas a repensarem o modelo home office e muitos adotaram o regime de escalonamento reforçando a importância do trabalho híbrido. Esse formato foi bem aceito por oferecer uma flexibilidade ao equilibrar o trabalho presencial ao formato remoto mantendo as relações de trabalho alinhadas com a cultura da empresa.

Embora a prática tenha sido bem aceita por líderes e colaboradores, o trabalho híbrido não agrada a todos, principalmente àqueles que não têm uma estrutura adequada para desenvolver o trabalho remoto, assim como os colaboradores que moram muito distante do trabalho. Essas pessoas passaram a avaliar se compensa ficarem aproximadamente 3 horas no trânsito diariamente por conta de um trabalho que não é insubstituível.

Por outro lado, as empresas que não conseguiram repensar o modelo formal de trabalho optaram por voltarem ao trabalho 100% presencial. Essas empresas estão vendo seus colaboradores se demitirem voluntariamente. Esse fenômeno foi registrado nos Estado Unidos e já está acontecendo aqui no Brasil principalmente nos cargos mais eletivos.

Isso se deve ao fato de que as pessoas que tiveram a oportunidade de experimentar um modelo de trabalho mais flexível, não estão dispostos a renunciarem essa flexibilidade  para ficarem horas no trânsito visto que esse tempo poder ser utilizado para cuidarem da vida pessoal e da família. Essas decisões impactam significativamente na qualidade de vida e no bem-estar. Neste sentido as empresas que insistirem num modelo mais conservador corre o risco de perder terão dificuldades de reter talentos na empresa.

Vale ressaltar que o mundo mudou, o conhecimento foi democratizado com as plataformas digitais, o modelo de consumo também foi alterado, assim os processos produtivos e consequentemente a forma de liderar e gerenciar as relações de trabalho precisa ser revisto.

Não é possível falar de empregabilidade e retenção de  talentos focando apenas em salários altos e planos de carreira as custas de jornada exaustivas com ênfase apenas em performance e resultados em detrimento da saúde e bem-estar do colaborador.

Liderar nesse novo cenário  exige do gestor visão e flexibilidade para ajustar as mudanças e acima de tudo resiliência, criatividade e competência socioemocional para inspirar a equipe, preservando o bem-estar coletivo sem colocar em risco a produtividade e a saúde da empresa. Nesse contexto empresa competitiva, tem processos sustentáveis, gera valor e inspira confiança em todos os sentidos.

 

Marilene de A. Martins Queiroz

Psicóloga, Mestra em Psicologia, Diretora do Instituto Habiens de Neurociência e Comportamento, Presidente do Conselho Setorial de Gente e Gestão da ACIEG